Sob o Sol
-Olha ali.
Acompanhei a direção de seu olhar, sem saber exatamente o que havia para ser olhado.
-O quê?
-Tá vendo aquela garota de chapéu?
-Tô...
-Não pára de te olhar...
-!
Era uma garota oriental de rosto e corpo delicados. Estava com um biquíni azul, recostada em uma cadeira de praia.
-Melhor você dar um mergulho porque o sol deve estar cozinhando os seus miolos!
-Vou mesmo... você vem?
-Vou daqui a pouco...
Continuei deitada sobre a esteira e sob o guarda-sol, sem a menor intenção de ir para o mar. De uma das barracas de coco vinha uma música da Daniela Mercury, crianças passavam correndo, casais passavam de mãos dadas: era férias!
-Vai um sorvete aí, moça?
-Tem de uva? – levantei os óculos de sol.
-Tem, sim.
Me levantei para pegar o dinheiro, mas... onde é que o Alberto tinha escondido mesmo? Demorei uns dois minutos para achar e, quando me virei, vi a garota japonesa-ou-chinesa-ou-coreana-ou-sei-lá-o-quê ao lado do sorveteiro, me encarando com um sorriso.
- Eu pago o dela também – disse, com o sorvete dela na mão.
-Se liga, garota! Nem te conheço – meu tom variava entre surpreso e indignado.
Me apressei em pagar o sorvete e sair dali. Fui caminhando em direção à barraca de coco mais lotada e qual não foi a minha surpresa quando notei que ela estava caminhando ao meu lado.
-Eu também gosto de sorvete de uva.
Ela tinha o mesmo tom de voz de uma amiga do colégio que tentara me beijar numa festa a fantasia havia muito tempo.
-Ahhh – respondi, sem interesse, olhando para o lugar onde ela estivera sentada. — Você tá sozinha aqui na praia?
-É, os meus pais me trouxeram aqui mas já voltaram para Campinas. Eles acham que eu estou um pouco estressada...
Aquele tom de voz suave me fez lembrar a trajetória da outra: depois que ela tentara me beijar, cortei relações com ela por achar que aquilo era pecado, mesmo assim ela me mandava bilhetes apaixonados e, por fim, tentara se matar; depois disso, seus pais acharam melhor mudarem de cidade e eu nunca mais a vira. Ela então sorriu para mim e tentei desanuviar os pensamentos.
-E você? Tá com o seu marido?
-É... quer dizer, não... é meu noivo. A gente vai se casar no ano que vem.
-E você gosta dele?
-!
Aquela situação era completamente absurda. Falei que tinha que ir, já caminhando em direção ao mar, mas ouvi que ela estaria ali todos os dias, até o fim das férias.
***
Eu estava, em parte, de férias, mas o Alberto não, de modo que ele ia a São José dos Campos toda segunda de manhã e voltava sexta à noite para ficar comigo. Estávamos em um apartamento emprestado por amigos, em Ubatuba, e nos dias de semana eu me ocupava em dar seqüência ao romance que estava escrevendo; o prazo de entrega dos originais se esgotaria em poucas semanas e eu não havia pensado em um desfecho ainda. Às vezes ficava sentada em frente ao laptop por muito tempo sem conseguir produzir nada, então eu ia dar uma volta pela praia, evitando a parte em que a garota disse que estaria “todos os dias, até o fim das férias”. Mas foi num dia desses, entre frustração e tédio, que ela me achou. Tapou meus olhos, perguntando quem era. Me assustei um pouco, mas sabia que era ela, com aquele tom de voz...
-Não adianta tentar adivinhar quem é, porque você não me conhece pelo nome. E, destapando os meus olhos: — Prazer, meu nome é Vivian... esqueci de dizer no outro dia.
Eu estava perplexa e não consegui disfarçar o sorriso.
-Pede uma água de coco ali... fala que é por minha conta.
-Tá, depois te pago um sorvete – disse ela, sorrindo.
E ela foi. Estava com o mesmo biquíni do outro dia e com uma canga, no mesmo tom de azul, amarrada na cintura. A água do mar escorria por seus cabelos, molhando suas costas e cintilando ao sol.
Depois de alguns minutos voltou com o coco na mão e sentou-se na cadeira ao meu lado.
-Você gosta bastante de azul, né?
-Adoro azul... por isso gosto dos seus olhos também – disse, olhando nos meus olhos, ao que desviei o olhar. Minha amiga me olhara daquela forma antes de tentar me beijar.
Era difícil admitir para mim mesma que eu havia pensado muito naquela garota e talvez por ter convivido um bom tempo com ela em pensamento, sua presença já não era tão perturbadora.
-Tá vendo aquele prédio verde ali? – apontou. — Eu moro ali... quer dizer, vou ficar ali até o fim das férias...
-Que bom, é bem perto da praia.
-É... quer ir lá?
Aceitei sem pensar muito. Paguei pelos cocos e fomos.
-E o seu chapéu?
-Ah, perdi na ventania de ontem... saiu voando...
***
Era um apartamento típico de veraneio, sem muitos móveis. Um pouco triste.
Depois de ela me mostrar o apartamento e conversarmos um pouco, olhando o mar e as pessoas no beiral sacada, falei que tinha que ir porque já estava anoitecendo. Ela então me olhou da mesma forma que havia me olhado quando estávamos na mesa do quiosque de coco... e me beijou. Dessa vez não relutei, não pensei em Deus nem em pecado, apenas retribuí o beijo, doce como ela. E quando me puxou para o quarto, eu fui. Me sentou na cama e foi tirando o meu vestido enquanto me beijava, procurando minha língua. Tirou meu sutiã, beijou os meus seios, acariciou minhas coxas com as mãos e depois com a língua morna. Abaixou minha calcinha úmida pelo calor e pela excitação. Me puxou para o banheiro, me colocou debaixo da ducha fria e depois de tirar a canga e o biquíni, também entrou no boxe. Procurou minha boca sob a água e acariciou meu corpo enquanto me beijava, agora um pouco mais voraz.
-Eu nunca fiz isso – cochichei em seu ouvido.
-Não se preocupe, você vai gostar...
Eu a ensaboei, acariciando todo o seu corpo e senti que ela estava ficando muito excitada, o que me deixava mais excitada ainda. Chupei seus mamilos, já durinhos, e ouvi seus gemidos abafados. Ela fez o mesmo comigo, passando a mão entre as minhas pernas, até alcançar a parte que implorava para ser tocada. Continuou me tocando por um tempo e, vendo a minha indecisão, conduziu minha mão entre suas pernas; ao tocá-la, estremeceu de prazer. Ficamos assim por um tempo, depois lavou meu cabelo e meu corpo, beijando minha nuca e minhas costas, me abraçando por trás e acariciando meus seios com as mãos de vez em quando. Seus toques eram suaves, quase distraídos, e me causavam uma excitação diferente da que eu sentia com homens.
Banho tomado, nos enxugamos e ela me conduziu para sua cama desfeita. Me deitou gentilmente sobre o travesseiro cheirando a lavanda, entrelaçando suas pernas nas minhas enquanto me beijava e sua mão percorria minha pele arrepiada. Acariciando-lhe, senti seu sexo molhado e quis beijá-la ali. Troquei de posição, ficando por cima, e fui sentindo seu corpo com a minha boca, até chegar onde queria. Abri suas pernas, beijei o interior de suas coxas e lambi de leve seus pelinhos, para depois sentir seu gosto. Seu clitóris estava intumescido e ela começou a ter leves contorções assim que minha língua o tocou. Lambi-a com vontade, primeiro devagar, depois com movimentos mais rápidos, cuja intensidade aumentou assim que senti suas pernas tremerem, o que resultou em um gemido quase sem fôlego. Beijei seu corpo, agora de baixo para cima, alcançando sua boca e sua língua, abraçando-a como se fosse a última vez. Ela se livrou dos meus braços, quis me dar prazer também, e repetiu o que eu fizera com ela; eu estava inebriada, todos os meus sentidos estavam famintos e ao mesmo tempo saciados.
Naquela noite, escrevi por horas a fio e consegui terminar o livro. A última frase eu lembro de cor: “Como se tocados pelo sol, depois de uma longa geada, despertaram sedentos de vida”.
No verão seguinte, passei em seu prédio verde para entregar-lhe o livro que dedicara a ela: Para Vivian, pelo sol. Ela continuava irradiando uma beleza indizível, embora estivesse um pouco diferente. Pedi que me escrevesse quando terminasse de ler o livro e até hoje espero uma carta, um e-mail, um telefonema, uma palavra.
Escrito por Sumire